Advento: a espiritualidade da espera

O tempo litúrgico que iniciaremos nas vésperas do próximo domingo é dotado de uma rica e profunda espiritualidade própria da expectativa da Igreja que, desde sempre, aguarda ansiosa a definitiva vinda de seu Esposo, Jesus Cristo. O clamor pela vinda e chegada de Cristo novamente à história humana acompanha o drama dos filhos da nova e eterna aliança, que desde a manifestação plena de Deus em Jesus Cristo, exclamam pressurosos: Maranathá! Vem, Senhor Jesus!

A espera da Igreja se intensifica neste tempo próximo das festividades do Natal do Senhor. O tempo e a liturgia se revestem de uma mística singular a ponto de transmitirem para os fiéis um forte sentimento de esperança. As profecias contidas nas Escrituras Sagradas revestem a Igreja de uma forte esperança: vindo até nós o Ungido de Deus, o Messias, o Emanuel, toda situação de dor e opressão será transformada; toda injustiça será corrigida; toda maldade será erradicada. A confiança na ação do Deus que vem gera em nós um vigor de esperança!

Assim, apresentamos alguns pontos essenciais para bem compreendermos esse tempo especial e forte na Igreja. Compreendendo com nosso espírito, façamos com que a mística desse tempo envolva a nossa vida diária e nos coloque dispostos a acolher esse hóspede que vem até nós.

Advento

Palavra com etmologia latina, proveniente do termo adventum, que significa a vinda ou chegada [de alguém]. No contexto da Liturgia Católica, o Advento é o tempo preparatório no qual se reflete e se celebra a alegre expectativa da vinda de Cristo até nós.

O sentimento

A alegre expectativa reflete a ansiedade da Igreja reunida em aguardar a definitiva vinda de Cristo ao mundo em sua segunda vez. Desde a Ascensão de Jesus aos céus, a Igreja aguarda a sua nova vinda, quando virá julgar os vivos e os mortos e para estabelecer o seu Reino que jamais terá fim. Enquanto aguarda, a Igreja permanece vigilante e confiante no retorno de seu Senhor e na instauração de seu Reino para toda a eternidade (cf. Mt 25, 1-13).

A expectativa transforma-se em esperança

O Advento é tempo de esperança. A expectativa quando unida à oração da Igreja transforma-se na “espera no Senhor”. A esperança é a manifestação divina na história da humanidade. Jesus Cristo é o filho do Deus da esperança, que tudo transforma, que tudo realiza, que tudo ressignifica. Assim, somos conduzidos pela espiritualidade de um tempo que nos lembra a nossa pobreza e que reforça que, diante da providência de Deus, nós respondemos com a confiança em sua bondade.

Advento é também mudança

O caráter preparatório do Advento imprime, não só nos fiéis, mas em toda a Igreja, um espírito de mudança. A preparação devida requer uma organização da vida exterior e interiormente para que todos se encontrem preparados e vigilantes para acolherem ao Senhor que vem. Na Liturgia essa mudança é expressiva. Com as primeiras vésperas do Primeiro Domingo do Advento inicia-se um novo Ano Litúrgico. É na preparação para o nascimento de Jesus que a Igreja renova a sua celebração e reinicia o ciclo de celebração dos mistérios da fé cristã: encarnação, nascimento, vida, paixão, morte, ressurreição e ascensão de Jesus.

A Liturgia

A celebração da Igreja exprime o caráter vivencial deste tempo que é forte para toda a ação da Igreja. O Advento transpõe os limites do culto e inunda com seu espírito todas as atividades da Igreja, que cotidianamente, seja na oração, no trabalho ou na celebração, suspira pelo retorno de seu divino esposo. Desse modo, assegura a Liturgia da Igreja que:

“O tempo do advento possui dupla característica: sendo um tempo de preparação para as solenidades do Natal, em que se comemora a primeira vinda do Filho de Deus entre os homens, é também um tempo em que, por meio desta lembrança, voltam-se os corações para a expectativa da segunda vinda de Cristo no fim dos tempos. Por este duplo motivo, o tempo do advento se apresenta como um tempo de piedosa e alegre expectativa” (Normas Universais do Ano Litúrgico e Calendário – NUALC, 39).

Duas vindas de um mesmo Senhor

As quatro semanas do Advento expressam o desejo da Igreja de receber a visita de Deus, que vem em socorro da humanidade. Os textos do Primeiro Domingo do Advento nos ciclos dos anos A, B e C realçam o caráter escatológico da peregrinação da Igreja e da parusia, a vinda gloriosa de Jesus. A recordação desta vinda gloriosa e da permanente presença do Senhor (cf. Mt, 28,20) é a tônica principal das duas primeiras semanas deste tempo forte.

Nas duas últimas semanas algumas características mudam o enfoque do Advento para a celebração do Natal do Senhor. São elas: o Terceiro Domingo do Advento – Dominica Gaudete – que se diferencia pela sóbria alegria dos paramentos róseos; e o período entre os dias 17 e 24 de dezembro, no qual se intensifica a preparação da Igreja para a celebração da Solenidade do Natal.

O Prefácio do Advento IA recorda à Igreja uma terceira vinda de Cristo, que acontece no cotidiano da Igreja e do povo de Deus. Cristo vem na pessoa do mais fragilizado e injustiçado. Ele vem nessa condição para que possamos reconhecer no sofrimento do irmão uma nova possibilidade de vivenciar os apelos do Advento. Ele vem por meio de sua manifestação na vida sacramental da Igreja, dando-se sempre em presença para todos aqueles que dos Sacramentos se aproximam. “Ele veio. Ele vem. Ele virá!”

“[…] agora e em todos os tempos, ele vem ao nosso encontro, presente em cada pessoa humana, para que o acolhamos na fé e o testemunhemos na caridade, enquanto esperamos a feliz realização de seu Reino” (cf. Prefácio do Advento IA).

Um tempo de linguagem simbólica

O Advento, na Liturgia, é marcado pela riqueza de alguns símbolos que derivam de uma tradição milenar e que apresentam uma linguagem rica em conteúdo e espiritualidade. Os símbolos do Advento introduzem a Igreja no mistério celebrado e anunciam a sua preparação para o acolhimento de tão grande mistério.

A cor dos paramentos para a vivência deste tempo é a cor roxa. Deve se destacar que a tônica do Advento é completamente diferente da tônica quaresmal. Se nesta a Igreja se reveste de um caráter penitencial, na primeira, representa um sentimento de introspecção e de preparação para a chegada gloriosa de Jesus. Representa a alegre expectativa da Igreja em receber em seu meio o seu Salvador.

A Coroa do Advento, tão popular em nossas comunidades, é um sinal pedagógico para o povo acompanhar, no acendimento das velas a cada domingo, a iminência da chegada do Emanuel. Cristo é a luz do mundo, que dissipa as trevas do coração humano e irradia justiça e paz a todos. A cada vela acesa, o coração da comunidade se alegra, pois em breve chegará a grande luz, o sol nascente que arma sua tenda em nosso meio (cf. Jo 1, 1-14).

O presépio é outro símbolo forte que marca esse período de preparação para a chegada de Jesus. Ao contemplar a cena da pobreza humana que aguarda a chegada do Menino Deus, nossos corações se revestem do mesmo desprendimento e se colocam solidários ao cuidado de Maria e José que, em completo abandono, não mediram esforços para ver a glória de Deus encarnada. Ricos e pobres, privilegiados e marginalizados, todos tem lugar em torno do Emanuel.

A música

As celebrações do Tempo do Advento são enriquecidas por belas composições, sóbrias melodias que enaltecem o sentimento de clamor e de expectativa do Advento. Em sua grande maioria, as canções propostas para a Liturgia do Tempo do Advento embalam as comunidades na certeza de que o Senhor virá para libertar o seu povo de todos os seus pecados. Neste tempo propício, o canto litúrgico rememora a sua gênese quando o sentimento que expressa é justamente aquele que levaram os pais de Israel a glorificarem o Senhor: a libertação do mal e da morte (cf. Ex 15, 20-21). Clamando pela vinda do Messias, a Igreja canta o íntimo desejo de todos os seus filhos: Maranathá! Vem, Senhor Jesus!

Com Maria, a Mãe da Esperança

A Virgem Maria é o ícone da expectação. Representa em sua natureza pessoal os clamores de seu povo que, por séculos afora, clamava pela libertação de Israel e pela chegada do Messias. Ela, recebendo em seu ventre o autor da vida, viveu profundamente o Advento na medida em que gerava o corpo do Filho de Deus. Maria é senhora da Esperança! Acredita na Palavra confiada e anunciada; pronuncia a sua aceitação e se compromete com o plano de amor de Deus.

O Advento é um tempo mariano, pois é Maria que na sua gestação nos ensina a estreitarmos os laços com o Menino que nascerá e a prepararmos o presépio de nosso coração para que verdadeiramente ele nasça. Neste tempo propício celebramos sua Imaculada Conceição, sua Expectação e sua Maternidade. “Pelo seu sim transformou a espera do Messias em presença, a promessa em dom. Assim, Maria pode ser o melhor exemplo para nós numa Igreja que quer viver a presença de Cristo no mundo de hoje” (cf. MC 4).

Vivendo a graça que Deus derrama sobre nós neste tempo de alegre expectativa, nos coloquemos em atitude de oração e vigilância, aguardando a vinda de Cristo até nós. Que este tempo seja realmente propício para a nossa conversão e o nosso encontro pessoal com o Senhor, e que com toda a Igreja possamos exclamar: “Vem, ó Santo de Israel, vem nos dar a sua paz!” (cf. Jo 14,27).

Referências:

LUTZ, Gregório. A Espiritualidade do Advento. Disponível em: http://centrodeliturgia.com.br/a-espiritualidade-do-advento/.

______________. Normas Universais do Ano Litúrgico e Calendário. Publicado em Roma no dia 14 de fevereiro de 1969.

PAULO VI, PAPA. Marialis cultus. Para a reta ordenação e desenvolvimento do culto à Bem-aventurada Virgem Maria. Publicado em Roma no dia 2 de fevereiro de 1974.