Antes de entregar sua vida na morte, entregou-nos seu corpo no pão para ser comido, para ser alimento na caminhada. “Tomai e comei”… Tomai e bebei”.
Não devemos nos esquecer que foi em torno da mesa em um jantar que tudo isso aconteceu. A Eucaristia é a mesa da Vida. É a mesa da Refeição. É a mesa da Comunhão. É a mesa de Cada Um . É a mesa da Igreja. É a mesa da Libertação. É a mesa do Sacrifício, da Dor e daMorte. É a mesa da Esperança da Ressurreição.
A Eucaristia é isto: em torno do Senhor reúnem-se os que são seus, os que querem se conhecer, amar e servir, os que querem pôr em comum seus próprios dons afim de que a mesa se enriqueça e todos aproveitem o que pertence a cada um.
E nesse tempo da pandemia do Covid-19 não podemos, nem temos o direito de desvirtuar o sentido do que temos de mais sublime na Igreja.
O mundo inteiro agora está infectado. O novo coronavírus continua dando a volta ao globo, levando os ritmos habituais da vida e do comércio a uma paralisação quase total.
Nossas comunidades de fé foram pegas desprevenidas, incluindo presbíteros e bispos assim como qualquer outra. Há um confinamento litúrgico na expressão de Robert Mickens.
Apesar de muitas décadas de missas transmitidas pela TV e pelo rádio, as últimas semanas de liturgias públi–cas canceladas deveriam deixar muito claro que esse tipo de “participação virtual” precisa ser repensado.
Você não pode ter uma missa virtual, assim como não pode ter um jantar virtual. Obviamente, a analogia entre missa e jantar não é exata, porque não estamos falando de uma refeição normal quando falamos da Eucaristia. É uma refeição sacrificial; uma refeição/sacrifício celebrada em torno de uma mesa/altar.
O aspecto de refeição da celebração Eucarística não pode ser separado do seu aspecto sacrificial. Mas não deve ser quase completamente eliminado, assim como acontece com 99% dos membros da Igreja durante as missas virtuais. Onde não há necessidade de pessoas. O padre oferece o sacrifício em favor delas. E come a refeição sozinho, também. Os católicos terão que decidir por si próprios como vão rezar e participar dos mistérios sagrados desta Semana Santa e Páscoa. Talvez possamos tirar uma lição de Edith Stein, a convertida judia que se tornou freira carmelita e foi morta durante a Shoá. Ela sabia o que significava seguir em frente sem a Eucaristia. No dia 4 de agosto de 1942, ela escreveu estas palavras a partir de um campo nazista na Holanda, cinco dias antes de ser morta em uma câmara de gás em Auschwitz:
“Estamos muito calmos e alegres. É claro que, até agora, não houve nenhuma missa e comunhão; talvez isso venha mais tarde. Agora temos a chance de experimentar um pouco como viver puramente a partir de dentro”.
Celebramos hoje a festa da Eucaristia –essa refeição que tomamos juntos, que é uma refeição sacramental e que constitui o grande manifesto da presença de Jesus nas nossas vidas. Nós somos um povo gerado pela Eucaristia. Sem ela, não haveria nem Igreja nem cristãos. É graças ao continuar esta memória do que Jesus fez que podemos afirmar que nós vivemos.
Os gestos de Jesus são muito claros. Ele tomou o Pão e disse: «Este é o meu Corpo que é dado por vós». Tomou o Cálice e disse: Este é o meu Sangue derramado como sinal da Nova Aliança.E é a partir dissoque nós O recordamos, que temos a garantia de que Ele está conosco, todos os dias até ao fim dos tempos. Porque aquele pão se faz Corpo de Jesus, e corpo de uma história que vivemos em relação a Ele. Porque aquele vinho se faz Sangue de uma Aliança que experimentamos de muitas maneiras, mas sempre com um vínculo vivo que nos liga a Deus.D. José Tolentino Mendonça, atualmente Cardeal, diz: “não sabemos imaginar a nossa existência fora do diálogo com esta mesa. Esta mesa é uma máquina para fazer irmãos, é um dispositivo de comunhão que erradica muros e desigualdades, é o umbral de um mundo novo”.
Esta Mesa da Eucaristia nos leva a um compromisso, tão poeticamente descrito por Goretti Santos: “Se neste Pão Vos vemos no olhar da fé…Como fechar os olhos a Vós Inteiro no corpo e sangue das pessoas?
Se nesta partícula de Pão tem Vosso cheiro….Como não respirar os perfumes que guardam as noites e madrugadas de nosso planeta terra?
Se nesta fração de Pão, em meio ao clarão de luzes nos aqueceis… Como não tentar ao menos ser chama de vosso amor no mundo?
Se entre o verde da esperança e a coragem da luta vos fazeis em pedaços para todos nós... Como ficar parados sem nos partirmos em inúmeros fragmentos?
Se a cada ato de amor vosso mistério se renova… Como não estar abertos ao novo, a uma nova maneira de agir que nos leve para mais perto de Vós?
Se entre a Cruz e a Hóstia sois morte e ressurreição… Como não morrer e reviver plenamente e abundantemente livre no serviço a nossos irmãos? “
A mesa do Senhor é sempre mesa para o faminto. Na Igreja perdeu-se esta inteligência eucarística própria dos primeiros cristãos… houve um divórcio entre a missa como rito e a partilha do pão com os pobres. Se no mundo há fome, se os pobres estão junto de nós e a Eucaristia não tem para eles consequências concretas, então a nossa Eucaristia é só cena religiosa e como diz São Paulo «o nosso já não é um comer a ceia do Senhor»Por isso, se na nossa Eucaristia não participam os pobres, se não há partilha do alimento com quem não o tem, então a Celebração Eucarística fica vazia, porque lhe falta o essencial. Já não é a Ceia do Senhor, mas uma cena ritual que satisfaz as almas dos devotos, sendo uma grave diminuição do sinal querido por Jesus para a sua Igreja. A mesa do Corpo do Senhor deve ser sempre mesa da Palavra do Senhor e mesa da partilha com os necessitados.
A Eucaristia é isso e muito, muito mais, que não cabe em nossas palavras., a Eucaristia é tudo na vida na nossa vida, mas, perdoem-me aexpressão, não é AMULETO. Nesse tempo de Covid 19 alguns presbíteros saem pelas ruas com a Eucaristia e muitíssimos leigos pressionam alguns párocos a fazerem o mesmo. Jesus “inventou” a Eucaristia não foi para isso, foi pra algo muito mais sublime… Não se trata de menosprezar e muito menos querer eliminar as devoções ao SS Sacramento. Trata-se de, teologicamente, colocar as coisas no seu justo lugar. Não misturar as coisas.
Nessa 5ª Feira Santa Sem Missa, agradeçamos a JESUS ter-nos deixado o dom preciosíssimo da Eucaristia e a coragem para crescermos cada vez mais na fé no que temos de mais sublime na nossa vida e na vida da igreja e do mundo. “Tomai e comei: este é o meu corpo que será entregue por vós”.