O mês de agosto, na Igreja, é dedicado a vocação. Em cada domingo a comunidade eclesial é convidada a refletir uma vocação especifica. O primeiro domingo é voltado para o ministro ordenado, ou seja, o presbítero; no segundo, o foco é a família (com o dia dos pais); no terceiro evidencia-se a vocação da vida religiosa consagrada, ou seja, daqueles e daquelas que radicalizaram o seu batismo num Instituto de Vida Consagrada, numa Ordem ou numa Congregação; o quarto domingo, visa o ministério dos fiéis nos mais variados movimentos, carismas e pastorais existentes na comunidade de fé; e por último, quinto domingo, a Igreja reflete a vocação do catequista.
Veja, caro leitor e cara leitora, que todo batizado e batizada tem a graça de continuar a obra de Jesus Cristo, que passou pela terra fazendo o bem (At 10,38), nestas mais variadas formas de vidas enquanto Igreja. Digo forma de vida porque, de fato, toda vocação visa a vida. Vida plena, vida em abundância (Jo 10,10) para todos e todas. Isto sinaliza que o Reino de Deus está aqui e agora através de cada um e cada uma que responde SIM a vocação. Um SIM que, neste Ano Santo da Misericórdia, cada pessoa é chamada a viver e a entender a todo instante que sua adesão a Jesus Cristo significa: Sou Inteiramente Misericórdia do Pai. Para tal, cada membro deste corpo místico de Cristo, que é a Igreja, deve nutrir o mesmo sentir e pensar que no Cristo Jesus. Ele, existindo em forma divina, não se apegou ao ser igual a Deus, mas despojou-se, assumindo a forma de escravo e tornando-se semelhante ao ser humano (Fl 2,5-7). Deste modo, a vocação é para Deus em favor de tudo e de todos. Não é para si e muito menos para uma autopromoção.
Partindo desta compreensão exposta acima, pode-se afirmar que, quando alguém diz “eu tenho vocação” pode caracterizar-se – sem exagero – equivalidamente a uma usurpação daquilo que é de Deus. Para ser mais claro, evidencia-se aquela tendência que cada um de nós tem em querer tudo possuir. Neste caso, inclusive possuir a Deus e seus dons como algo exclusivo. E esse ato de possuir leva, por vezes, a um endeusamento e atitudes levianas. Em muitas situações pessoas e coisas que estão sob os cuidados desta, são subjugadas e maltratadas mediante a essa parca ideia de que tem/possui a vocação. Ainda tem mais. Esse pensamento que “tenho vocação”, traz, em muitos casos, realidades profundamente angustiantes. Ou seja, leva a alguns a acreditar que nasceu para aquela vocação especifica. Portanto, ao ter em mente isso, uma reopção de vida a deixa, por vezes, em depressão, porque pensa que mudança de estilo de vida é uma traição a Deus. Portanto, condenada.
Ao fazer essa reflexão, não se pretende aqui cair num laxismo e/ou legitimar a infidelidade. E mais ainda. Não se quer aqui desvalorizar ou amortizar uma opção vocacional por toda a vida. Pelo contrário, o que se quer referendar é o essencial: a vida, dom de Deus, dado a todos, para que possam viver o seu verdadeiro sentido para o qual foi dado. A realização do bem, que é o amor. Assim, implica salvaguardar este precioso dom. Dessa feita, vale ir concluindo toda essa reflexão dizendo o seguinte: ao invés de dizer “Eu tenho vocação”, deve-se inculcar que o correto a ser dito é: “eu sou vocação”. Entendida assim, a vocação ou as vocações assumidas ao longo da existência de cada um e cada uma são respostas exigidas mediante a escuta e a sensibilidade para com uma realidade bem concreta. Um “acidente” que respeita e corresponda a realidade atual da pessoa. Nesse sentido, o SIM diz respeito ao querer viver o bem naquilo que se optou por viver naquela realidade. Sem perder de vista uma única causa. Qual causa? A do Reino de Deus. Nisto está a consistência em dar sentido a vida, doando-se ao outro num modo de vida que exige esvaziamento de tudo aquilo que é desumanizante, a saber: o orgulho, o poder, o preconceito, o machismo, o fanatismo, a ganância, a vaidade, a impiedade, a falta de perdão, e toda uma lista de maldade que mata e destrói a criação de Deus.
Asseverado que não “tenho vocação”, mas sim que “sou vocação” o SIM nas mais variadas formas de vida dentro da Igreja vai dando sentido a existência na medida em que cada pessoa se entende como: Sou Inteiramente “Misericórdia do Pai”.
Por fim, fica algumas perguntas: como você está vivendo este “eu sou vocação” na realidade eclesial, social e política? Tem vivido isso num profundo esvaziamento e numa opção de vida que, de fato, tem sentido para toda a criação, inclusive o seu semelhante? Pare e pense o quanto você pode fazer, juntamente com outros, para que o mundo seja mais humano e fraterno. Afinal, você é vocação de Deus.