Matosinhos celebra 250 anos de entronização da imagem de Nossa Senhora da Lapa

Como parte da programação do Jubileu do Divino, a Paróquia Senhor Bom jesus de Matosinhos realizou na noite de quinta-feira,18, a Vigília de Pentecostes. Conduzida pelo pároco do Santuário, Padre José Bittar, a celebração consiste em nos preparar para a grande festa de Pentecostes. Também esteve presente na cerimônia o vigário paroquial, Padre Ronan Jesus. Juntos, os sacerdotes realizam o ato de coroar a imagem de Nossa Senhora da Lapa que este ano completa 250 anos de devoção na região.

A vigília de Pentecostes é uma das mais especiais celebrações da nossa Igreja. Como na vigília pascal, administrava-se o batismo, unido à crisma. Se a noite pascal dava mais ensejo para acentuar o batismo – morrer e ressuscitar com Cristo, – o tema pentecostal refere-se, antes, ao dom do Espírito, relacionado com a crisma. Encorajada pela memória do primeiro Pentecostes, a Igreja reaviva hoje a expectativa de uma renovada efusão do Espírito Santo. Assídua e concorde na oração com Maria, Mãe de Jesus, ela não cessa de invocar: desça o vosso Espírito, ó Senhor, e renove a face da terra.

Para marcar a data, vai haver uma procissão neste domingo, 21, saindo do Santuário, passará pela Praça SBJM em frente ao Senai, Rua Dr. Elói Reis, Rua Alberto Magalhães, Rua Osvaldo Cruz, Av. Josué de Queiroz e Praça do Santuário.

Devoção

A história dessa invocação remonta aos tempos do Império Árabe, quando os mouros tinham domínio sobre a Península ibérica. Quem a narra é Nilza Megale:

“Almansor, califa de Córdoba, invadiu a Lusitânia, devastando os campos, destruindo a ferro e fogo vilas e cidades, martirizando os cristãos e profanando a clausura das casas religiosas. Após assolar as províncias entre o Minho e o Douro, o representante de Maomé dirigiu-se no ano de 983 para Quintela, atacando e destruindo o convento das freiras beneditinas de Aguiar da Beira, que foram aprisionadas e levadas em cativeiro. Algumas religiosas que conseguiram escapar esconderam em sombria lapa situada nas proximidades uma pequena imagem de Nossa Senhora. Séculos depois, em 1498, uma menina chamada Joana, muda de nascença, encontrou a imagem e a escondeu na cesta que trazia o pão e as maçarocas que fiava. Julgando ter achado uma boneca, com ela brincava vestindo-a e cobrindo-a de folhas silvestres. Nesse inocente passatempo foi surpreendida pela mãe, que irritada lançou ao fogo a santinha. Joana, recuperando milagrosamente a fala, protestou, retirando das chamas o objeto de seus desvelos, e contou como havia encontrado a linda efígie no fundo de uma gruta, na escarpada serra de Quintela. A mãe, atônita, sentiu que seu braço direito estava paralisado e só recuperou os movimentos quando ela e a filha foram à caverna e, colocando a imagem no antigo lugar, se prostraram de joelhos aos pés da Virgem, que daí em diante se tornou conhecida pelo título de Nossa Senhora da Lapa. Devido aos estupendos milagres ali realizados, mais tarde foi construída sobre as pedras da gruta um suntuoso templo, que até os nossos dias atrai a devoção dos povos circunvizinhos.”

A devoção a Nossa Senhora da Lapa foi trazida ao Brasil pelos portugueses, com maior destaque para Salvador/BA (Convento de N. S. da Lapa) e Rio de Janeiro / RJ (Igreja da Lapa do Desterro e Igreja da Lapa dos Mascates ou Mercadores). Ao redor de São João del-Rei, além de sua presença em Matosinhos, existe uma capela de que é orago na zona rural de Lagoa Dourada, povoação do Olho d’Água, junto ao leito do “Caminho Novo” da Estrada Real.

A Virgem da Lapa, desde o começo dos festejos em Matosinhos, tinha seu dia próprio na terça-feira após Pentecostes. Sua festa era sequencial à do Divino (Domingo de Pentecostes) e a do Bom Jesus de Matosinhos (segunda-feira). Seu desenvolvimento era como o dos demais dias, como se pode conferir facilmente pela consulta aos antigos jornais. É uma das mais antigas devoções do bairro, posto que, segundo consta, sua imagem existe em Matosinhos desde 1773, patrimônio doado pelo vigário Padre Dr. Matias Antônio Salgado.

Tudo leva a crer que a imagem seja portuguesa. A iconografia é a mesma de Nossa Senhora da Conceição. Diferencia-se apenas por não ter a lua debaixo dos pés, o que me parece ínfimo. Já vi imagens da Virgem da Conceição sem a lua e nem por isso chamadas Senhora da Lapa. Essa confusão não só me aflige como também a quase todos, tanto que por muitos anos do século XIX ao XX, a imagem de Matosinhos, foi chamada “Nossa Senhora da Conceição da Lapa”, nome considerado errôneo pelos estudiosos. Em 1923 aparece expressamente citada apenas como Nossa Senhora da Conceição, sem qualquer uso da palavra lapa. Parece-me antes, e seria de se pesquisar, que a imagem original portuguesa encontrada numa lapa (gruta, caverna, loca), seria iconograficamente uma Virgem da Conceição. Por ter sido encontrada numa lapa ganhou tal nome. Aqui no Brasil da mesma sorte, a imagem da Conceição achada no Rio Paraíba do Sul, ganhou o nome de “Aparecida” porque apareceu das águas; “Nossa Senhora da Conceição Aparecida”, ganhando depois o manto característico. No mais, Nilza Megale, descreve a iconografia da Mãe da Lapa de alguns lugares que não é bem como a de Matosinhos. Seja como for, a nossa é a da Lapa, pelo menos no que se refere à tradição.

Sua peanha é maciça, cheia de rostos de anjos barrocos. A parte que representa Maria é oca (o que favorece o conjunto por diminuir o peso total). O panejamento é muito detalhado. A coroa antiga, em prata maciça, cinzelada e martelada, está hoje no acervo do Museu de Arte Sacra da cidade. A coroa que agora usa é de liga metálica (chumbo, antimônio, estanho), sendo banhada a prata. Após a restauração ganhou um par de brincos e as cores, dizem, estão mais intensas.

Em todos os antigos jornais que pude pesquisar ou em quaisquer outras fontes e documentos nem tampouco na tradição oral, jamais achei uma só referência, ou simples alusão, citação ou trecho que dê margem a qualquer interpretação, em que se possa afirmar com segurança, que essa imagem saía outrora em procissão nas festas. Se de fato saía em procissão não se registrou ou esse registro se perdeu ou não o localizei. Não sei muito menos de alguém que o tenha achado. Mas pode ser que se encontre com o decorrer das pesquisas.

Tantos detalhes foram dados sobre o assunto, supostamente desnecessários, para se registrar um fato: se a Comissão do Divino não pôs essa imagem no andor antes (desde 1998 quando a festa foi retomada) é tão somente porque não dispunha dela, pois estava em restauração e não porque preferira a do Rosário, desrespeitando a memória histórica da festa. Tão logo a imagem chegou, foi incluída nas comemorações. A do Rosário se tornou satélite, sem sair na procissão, senão acompanhando a retaguarda do cortejo imperial, unicamente por ser a padroeira dos congados, o que outrora não era necessário por possivelmente não haver congados na festa antiga. A presença do Rosário foi uma homenagem aos congadeiros e um meio deles se ambientarem à Festa do Divino, à qual não estavam habituados em nossa região antes do resgate.

Quando da reintrodução da imagem restaurada na festa, a Comissão do Divino se empenhou muito em trabalhar a divulgação dessa devoção que já estava apagada. Graças a um trabalho consciente e de paciência, bem fundamentado, foi resgatada uma devoção perdida. Nos jornais, entrevistas, até no boca-a-boca sua devoção foi se espalhando. Foram feitos santinhos, com sua imagem estampada, contendo no verso e folhas internas, sua história, hino e oração, esta escrita por mim. O hino foi gentilmente composto pelo professor Abgar Antônio Campos Tirado a pedido dos festeiros. Desde então, a cada ano, o imperador procede à sua coroação e alguns festeiros carregam o seu andor ao redor do altar, sob aplausos, palmas e vivas, enquanto o Coral Coroinhas de Dom Bosco, da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar executa o referido hino, acompanhado ao teclado por seu compositor. (Fonte: http://festadodivinosjdr.blogspot.com)